sábado, 21 de novembro de 2009

Takkesage - O verso do Kesa




"Quando eu me encontrava na China da Dinastia Sung, no fim da plataforma elevada, notei que cada manhã no fim do zazen o monge ao meu lado apanhava seu manto, o colocava na cabeça e fazendo um gasshô, recitava o seguinte:

Que maravilhoso é este manto!
Como um campo que dá todo tipo de felicidade.
Agora desdobramos aquilo que o Buddha transmitiu,
Para que todos os seres fiquem felizes.

Ao ouvir isto, me enchi da maior emoção e alegria que jamais havia experimentado em minha vida. Sem querer verti lágrimas de gratidão, e meu colarinho se umedeceu. Por quê? Apesar de ter lido o Agama Sutra antes e ter notado ali este verso, não sabia como era feito, em todos os detalhes. Vendo isto ante meus próprios olhos naquele momento me encheu de alegria. Disse então para mim mesmo, "Ora vejam só, quando estava no Japão, meus mestres jamais me ensinaram isto, nem haviam bons amigos que me tivessem mostrado esta prática. Quanto tempo, lamento dizer, desperdicei em vão. Que feliz estou agora, já que devido às minhas boas ações no passado, fui capaz de chegar a constatar isto. Se tivesse ficado no Japão, como poderia ter disto me inteirado, isto é, de como o monge sentado ao meu lado praticava usando o manto do Buddha?" Cheio destes sentimentos misturados de alegria e tristeza, chorei copiosamente. Prometi então a mim mesmo, "Me tornarei, apesar de indigno de tal, um herdeiro correto do buddhismo, um recipiente da prática buddhista, e transmitirei o Dharma a meus concidadãos, que me foi corretamente transmitida junto com o manto."
Esta promessa não foi, fico feliz em dize-lo, em vão, pois muitos leigos e monges usam hoje o manto. Aqueles que receberam o manto devem venerá-lo sempre. Ao fazer tal, adquirem o mérito mais elevado. Não é muito difícil de ouvir uma palavra ou verso do Dharma, pois até as pedras e árvores o manifestam constantemente. Não importa onde formos, contudo, é muito difícil de encontrar o mérito do manto que foi corretamente transmitido.
Em outubro de 1224, dois monges coreanos, Chi Hyun e Kyung Oon, foram a Chingyuan-fu na China Sung. Apesar de darem palestras constantemente sobre os sutras, eram apenas eruditos. Suas aparências não diferiam daquelas de pessoas comuns, pois que não tinham nem um manto nem tigelas. Que trágico é ser um monge apenas aparentemente e não ter a essência de um monge. Isto se deve quem sabe ao fato de pertencerem a um pequeno país periférico. Quando monges japoneses vão a outros países, se parecem muito com estes dois camaradas.
O Buddha venerou respeitosamente o seu manto durante doze anos. Nós, que somos seus seguidores devotados, devemos nos aplicar ao estudo de tal fato. Não devemos jamais venerar o céu, divindades, Reis ou ministros para obter através disto a fama ou o lucro, pois que nada nos dará felicidade maior que venerar o manto buddhista."

Extraído do Kesa Kudoku - O Mérito de se Usar o Manto Buddhista.
Capítulo 82 do Shobogenzo de Dôgen Zenji (1200-1253). Adaptado da tradução do monge Ryokyu Marcos Beltrão.
Fonte: Ecos do Silêncio.


Nenhum comentário:

Postar um comentário